Empresário dono da Schahin acusa Eduardo Cunha de esquema de corrupção nas suas empresas
Dono da Schahin, alvo da Lava-Jato, diz que deputados ligados ao peemedebista o pressionam para beneficiar rival
Milton Toufic Schahin na Câmara dos Deputados
Agência Câmara / Arquivo/ Zeca Ribeiro
Dono de um conglomerado citado na Operação Lava-Jato como integrante de um esquema de pagamento de propina na Petrobras e sob crise financeira, o presidente do grupo Schahin, Milton Schahin, decidiu falar. Ele recebeu O Globo em seu escritório na Avenida Paulista, em São Paulo e, sem rodeios, afirmou que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), vem patrocinando um esquema de perseguição às suas empresas.
A ação, segundo ele, é capitaneada pelo empresário Lúcio Bolonha Funaro, com suporte de um grupo de parlamentares ligados a Cunha. O presidente da Câmara nega qualquer interferência no episódio. Cunha morou num flat em Brasília que era de propriedade de Funaro. Este, por sua vez, afirmou que trata do assunto apenas com a polícia e o Poder Judiciário. No entanto, admitiu que procurou parlamentares para denunciar o grupo Schahin.
Para Schahin, é o poder político de Cunha que tem permitido a Funaro, seu principal desafeto, acionar a metralhadora giratória contra as atividades das empresas do grupo. O cerco teria começado há sete anos e, segundo ele, está agora se repetindo na CPI da Petrobras.
Na Câmara, há registros de uma sucessão de requerimentos apresentados por parlamentares ligados a Cunha relacionados ao grupo Schahin. Questionado sobre o motivo de tantos pedidos de informações e investigação apresentados na CPI contra suas empresas, Milton responde:
— Vejo como pura sacanagem do Funaro. Agora você me pergunta: como o Funaro pode ter tanta força? Porque o Eduardo Cunha está por trás. Temos uma pendência muito grande com Funaro, e a ligação de Cunha com ele é muito conhecida.
E prossegue:
— O que é estranho é a Câmara se meter na briga entre duas empresas. O que deputados têm a ver com uma disputa judicial entre empresas?
Disputa sobre hidrelétrica que rompeu
A briga com Funaro data de 2008. A construtora Schahin foi contratada para construir a pequena central hidrelétrica (PCH) de Apertadinho, em Rondônia. Formou um consórcio com a EIT. Quando entregou a obra, a barragem rompeu, causando danos ambientais e obrigando cerca de 200 famílias a deixarem suas casas de forma preventiva.
O acidente causou uma longa briga judicial. Funaro, que representava a empresa Gallway, contratante do empreendimento, teria, na versão de Milton Schahin, prontificado-se a mudar a seguradora da obra, ainda quando o serviço estava sendo executado. A seguradora foi alterada, mas, segundo Schahin, o seguro não foi pago — informação contestada por Funaro.
Com o rompimento da barragem, Funaro foi cobrar a Schahin pelo prejuízo. A empreiteira alega que a causa do acidente foram falhas no projeto, fora da responsabilidade dela. Teve início uma disputa judicial que, segundo cálculos do próprio Funaro, está acima de R$ 1 bilhão.
Além do apartamento de Brasília, uma ligação de Cunha com Funaro é o ex-presidente da Cedae Lutero de Castro Cardoso, que ocupou o cargo por influência de Cunha. Cardoso assessorou a Gallway, que lucraria com a hidrelétrica de Apertadinho e da qual Funaro se apresentava como representante.
— Funaro entrou na Justiça contra a Schahin. Estranhamente, começaram a surgir iniciativas de deputados ligados a Eduardo Cunha para constranger, intimidar a Schahin. Passamos a ser chamados para prestar esclarecimentos em diversas comissões. Aí entra Eduardo Cunha e alguns interesses. Simultaneamente, eles, Cunha e Funaro, abrem o flanco, e Lúcio Funaro abre ação judicial na Petrobras para bloquear nossas contas.
Levantamento na base de dados da Câmara demonstrou que já foram apresentadas 33 proposições contra o grupo, o primeiro em 2008, dois meses após o acidente em Rondônia. São requerimentos diversos, a maioria apresentada na Comissão de Finanças e Tributação: esclarecimentos sobre a venda do banco Schahin para o BMG, investigação dos contratos firmados pela Petrobras com subsidiárias do grupo, como a EIT, Soratu Drilling, Bearfield Drilling, Riskle Holdins, Casablanca Internacional e South Empire, contratos em obra de gasoduto.
Grupo chegou a ter 10 mil funcionários
O que há em comum em todos os requerimentos: eles são assinados por cinco políticos que eram deputados na época, todos do círculo de convivência política de Cunha: Solange Almeida, Nelson Bornier, Alexandre Santos, João Magalhães, todos do PMDB, e Carlos William (PTC-MG).
Apesar de a hidrelétrica em questão ser em Rondônia, a maioria dos parlamentares que pediu investigação do projeto é do Rio. Solange pediu a convocação dos envolvidos na Comissão de Seguridade Social e Família. A então deputada usou como justificativa prejuízos de famílias atingidas pela barragem. Ela é uma antiga aliada de Cunha, a quem apoiou na campanha de 2014, quando já havia se tornado prefeita de Rio Bonito (RJ).
Em março deste ano, O Globo revelou dois requerimentos da Câmara assinados por Solange que reforçam acusações do doleiro Alberto Youssef contra Eduardo Cunha. Em delação premiada, ele afirmou que Cunha era um dos beneficiários de propinas relacionadas a um contrato de aluguel de um navio-plataforma da Samsung e da Mitsui, que teria como representante no Brasil o executivo Júlio Camargo, outro investigado na Lava-Jato que se tornou delator em troca de redução de pena. Nos requerimentos da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara, Solange pressiona publicamente a Mitsui e Camargo. O motivo, segundo o doleiro, seria uma suposta pressão para que as empresas retomassem o repasse de propinas que havia sido interrompido.
Apesar de ter negado qualquer relação com o episódio, Cunha figura nos registros da Câmara como “autor” dos arquivos em que foram redigidos os dois requerimentos. Registros do sistema de informática da Câmara foram requeridos pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que lidera o inquérito aberto contra Cunha no âmbito da Lava-Jato, autorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No fim de maio, quando os irmãos Schahin foram convocados a prestar depoimento na CPI da Petrobras, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) indagou Milton Schahin sobre o episódio da convocação dele por Solange. O empresário preferiu ficar em silêncio. Ao Globo, disse que, desde o episódio de Apertadinho, vem sendo pressionado a fazer um acordo com Funaro. Perguntado por que não fechou um acordo, disse:
— Por que vou fazer negócio com bandido?
Na Câmara, mais de 30 pedidos de apuração
Desde o rompimento da barragem da hidrelétrica de Apertadinho, em Vilhena, Rondônia, em 9 de janeiro de 2008, o grupo Schahin foi alvo de mais de 30 iniciativas de deputados ligados ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Foram diversos tipos de ações em comissões da Casa, de requerimentos de informação a pedidos de investigação e até um capítulo inteiro dedicado à empresa na CPI destinada a investigar a formação de tarifas de energia elétrica, setor no qual o grupo não atua.
Na atual CPI da Petrobras, há vários pedidos de investigação contra o grupo, além da quebra de sigilos fiscal, bancário e telefônico, e até um pedido de busca e apreensão nos escritórios da companhia, que não foi atendido pela PF. O deputado Altineu Côrtes (PR-RJ), outro aliado de Cunha, é dos mais ativos nesse sentido. Alguns requerimentos não têm a ver com o objetivo da CPI, que é apurar superfaturamentos e pagamentos de propinas na petroleira.
Alguns parlamentares se insurgiram
Na CPI da tarifa elétrica, em 2009, o relator Alexandre Santos (PMDB-RJ) incluiu um capítulo sobre Apertadinho no documento final. Quando apresentou requerimentos, alguns parlamentares se insurgiram. Foi o caso de Arnaldo Jardim (PPS-SP), engenheiro, para quem a construção de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH), obra realizada pelo consórcio Schahin-EIT em Apertadinho, nada tinha a ver com o objeto da CPI. Ele lembrou que as PCHs pouco influem na tarifa elétrica cobrada país afora. Sua opinião foi desconsiderada.
Essa mesma contrariedade foi manifestada em 2011 pelo então deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) e por Vanderlei Macris (PSDB-SP) durante audiência pública convocada por Nelson Bornier (PMDB-RJ) para discutir na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara supostas irregularidades na compra do banco Schahin pelo BMG. Entre os convidados estavam, além do presidente do banco, Carlos Eduardo Schahin (que não compareceu), Lúcio Bolonha Funaro, que se apresentou como presidente da Royster S/A, empresa que, segundo a Receita Federal, atua na área de administração de fundos por contratos ou comissões.
O então deputado Carlos William (PTC-MG) foi um dos mais atuantes sobre esse caso na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. Ele subiu à tribuna para criticar a atuação da Schahin, apresentou pedido de investigação dos contratos firmados entre a Petrobras e subsidiárias da empreiteira, além de solicitar que o Tribunal de Contas da União examinasse documentos suspeitos envolvendo o grupo.
Durante participação na comissão, Funaro discorreu sobre Apertadinho. Devanir e Macris reclamaram que a obra em Vilhena nada tinha a ver com a venda de um banco. Mas Alexandre Santos, que conduzia os trabalhos, alegou que o convidado dispunha de 20 minutos para abordar qualquer tema. Este ano, na CPI da Petrobras, Altineu Côrtes (PR-RJ), sub-relator para apurar suposto superfaturamento na construção de refinarias, voltou a apresentar requerimentos de informação usados no passado contra a empresa.
O conglomerado Schahin está se desconstruindo. Fundado em 1966, chegou a ter 10 mil funcionários. Agora, tem menos de mil. Na sede da empresa, na Avenida Paulista, em São Paulo, trabalhavam 300 profissionais. Hoje, não chegam a 30, de acordo com o presidente do grupo, Milton Schahin. Em abril deste ano, depois que a Operação Lava-Jato chegou à Schahin, o grupo pediu recuperação judicial para 28 empresas do conglomerado. O processo envolve um passivo de R$ 6,5 bilhões. Na semana passada, outra solicitação no mesmo sentido, desta vez para a subsidiária de petróleo e gás.
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Fonte: Contexto Livre
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