Crise no Judiciário – AMB x CNJ
Crise no Judiciário – AMB x CNJ
Quem disse que juízes são deuses? 
A injustiça é cega e a justiça enxerga bem, mas só quando convém
01 de Outubro de 2011 às 20:00
publicado no Observatório da Imprensa
Antonio Jorge Melo
Quem, nos meios jurídicos, ainda não ouviu a assertiva de que os juízes pensam que são deuses e os desembargadores têm certeza? 
Pois bem, até pouco tempo,  antes da providencial criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tal  afirmativa era, de certa forma, a pura expressão da verdade, pois, os  membros do Poder Judiciário sempre foram onipotentes. Nesta onipotência,  entre outras garantias, os magistrados só podiam ser fiscalizados e  julgados pelos próprios membros da instituição. E isto é compreensível,  pois deuses não precisam prestar contas a ninguém, pois, afinal, são  deuses. Nessa lógica, o CNJ, criado para fazer o controle e garantir a  transparência do trabalho dos magistrados, recentemente teve sua  competência contestada pela Associação dos Magistrados Brasileiros  (AMB), através de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Alega a representação sindical  dos magistrados que apenas as corregedorias dos tribunais estaduais  deveriam estar à frente de casos de censura e de advertência e que  punições, como aposentadorias compulsórias, disponibilidade e remoção,  deveriam ser regulamentadas por uma lei e não por resolução do CNJ. Sim,  há muitos juízes e desembargadores que se julgam deuses, mas,  felizmente, discordando dessa velha história de que há duas espécies de  magistrados: os que pensam que são deuses e os que têm certeza, há os  que ainda têm dúvidas e os que sabem que são humanos e, como tais,  falíveis. Dentre estes últimos, está uma baiana, a ministra Eliana  Calmon, que, em entrevista à Associação Paulista de Jornais (APJ),  criticando a posição da AMB, afirmou: “Acho que é o primeiro caminho  para a impunidade da magistratura, que hoje está com gravíssimos  problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás da  toga”.
Sempre temos argumentos para os  dois lados de uma questão judicial. Mas, antes mesmo do mérito da  questão levantada pela AMB ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal  (STF), as declarações da ministra sobre “bandidos que estão escondidos  atrás da toga”, desencadearam uma crise sem precedentes no Conselho  Nacional de Justiça (CNJ), onde, segundo o jornal “O Estado de São  Paulo”, o recurso da AMB tem o endosso velado de seus membros que são  juízes de carreira. 
“Data maxima venia”, as  declarações da ministra, ao contrário do que entenderam seus colegas do  CNJ e as lideranças da magistratura, não ofendem a honra dos juízes  brasileiros, mas, pelo contrário, expõem, com crueza e sinceridade, a  existência de uma minoria que compromete a autoridade de milhares de  magistrados que diariamente se dedicam ao ofício de julgar com  imparcialidade e honestidade, mesmo com o sacrifício da própria vida.
A afirmação da ministra  parece-me ser óbvia, mas, não raro, o óbvio é esquecido. Pois, não é  lógico pensar-se que, em um país onde a corrupção é endêmica, apenas o  Poder Judiciário fosse composto por profissionais íntegros, abnegados e  imparciais, verdadeiros bastiões da ética e da moralidade públicas.  Prefiro fazer eco às palavras da ministra e aos comentários que milhões  de brasileiros fazem pelas ruas e praças deste país e, parodiando  Voltaire, perguntar: por que, em um país onde não falta o que chorar  quanto ao lado físico moral das coisas, apenas com relação à Senhora  Justiça não haveria o que lamentar? É falacioso objetar que a  fiscalização externa da ação dos magistrados importaria na perda de sua  independência de julgamento e do seu poder disciplinar interno, mas a  atuação do CNJ, criado que foi pela Emenda Constitucional nº 45 como uma  resposta à crise da Justiça, parece incomodar muita gente e não tenho  dúvidas de que a retirada das suas atuais prerrogativas promoverá um  grande retrocesso institucional.
Por fim: saudações a quem tem  coragem! Agradeço à ministra Eliana Calmon por ter ousado dizer ao  Estado brasileiro o que o Poder Judiciário precisava ouvir, pois como  nos diz Gabriel, O Pensador, nos versos da canção intitulada Nunca  Serão: “A injustiça é cega e a justiça enxerga bem, mas só quando  convém”.
*Especialista em segurança pública
 
 
 
          
      
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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