terça-feira, 27 de dezembro de 2011

O NATAL SEM DEUS E SEM RELIGIÃO !!!

Enio Squeff: "A morte de Deus" e o Natal sem religião


Torna-se cada vez mais difícil associar a Natal ao nascimento de Cristo. Existe muito pouco hoje, na "maior festa da Cristandade" que conduza à conclusão de o Natal ser realmente uma festa cristã. É complicado, realmente, vender geladeiras e máquinas de lavar roupa, com as menções a Deus.

Por Enio Squeff*


O poema de Machado de Assis em que ele pergunta se somos nós que mudamos ou se o Natal, parece anteceder a uma questão hoje corrente: a irreligiosidade da sociedade contemporânea. Émile Zola - que foi um dos primeiros críticos a elogiar os pintores impressionistas - achou de chamá-los de "realistas": eles, de fato, romperam uma tradição do cristianismo, de pintarem o ideal, como seriam as cenas religiosas. Mesmo quando retratavam alguém, não raro, um Rubens, um Delacroix ou mesmo um Ingres, trataram de fazê-lo, tendo como pano de fundo, digamos, uma cena idealizada, ou antes, um fundo nenhum. Foi o que fez Charles Dickens. Em seu famoso conto de Natal ("Christmas Carol"), tratou de pôr fantasmas na mente culpada do empresário que maltrata seu empregado, a partir da descrição de um literal pesadelo. O espectro, que arrasta correntes pela casa, e que o persegue no meio da noite, é claramente o demônio de sua consciência. Em seu poema, Machado de Assis não fala da questão do consumo que, em seu tempo, era muito precário em comparação com o que se vê hoje em dia. Mas ao detectar uma transformação ("Mudaria o Natal ou mudei eu"?), o escritor projeta a resposta que o mundo deu no futuro: o Natal, em si, já não é uma festa religiosa. Tudo indica que o que mudou foi o Natal.

Talvez a questão resida, de novo, no Papai Noel, um ícone de mentira, que sabemos ser de mentira, e que, por isso mesmo, não passa de um ícore. Na verdade, o personagem não tem nada de religioso: ele atravessa os ares com seu trenó, deixa presentes às crianças, mas não reivindica qualquer ligação com o além. Não é o Cristo da Manjedoura que o envia. Quando muito, talvez, sugira, pelas cores, a Coca-Cola: foi com o refrigerante que o Papai Noel apareceu na forma que tem hoje. O mais é a mistura: os sinos tocam em Belém "para o nosso bem", etc e tal -mas os personagens da Manjedoura parecem resolutamente secundários, coadjuvantes quase. E para os chamados "crentes" - que na atualidade constituem mais de um terço dos religiosos do país- o Presépio sequer existe. Assim também nas representações públicas. No máximo, temos a parafernália das luzes que se enrolam nas árvores, ou que despencam dos edifícios como um espetáculo feérico - mas que parece ter mais a ver com o neon da publicidade do que com as cenas consagradas pela tradição - aquela que se estreita numa gruta, com o Menino, a Virgem, os pastores vindos ao longe - anjos luminosos, uma estrela guia, e as músicas ressoando desde a estratosfera.

Quando Nietszche disse que Deus estava morto, a reação alcançou todos os setores das religiões; a grita geral atingiu vários níveis e o próprio Nietszche foi anatemizado. Sua constatação, de que as religiões perdiam seus elos com a totalidade dos homens, a começar pela sua posição no Estado, nunca foi contestada pelos fatos. E o alarido que se seguiu a sua conclusão, fez muita gente contabilizar, não só os milagre - como os de Fátima, de Lourdes e outros -, mas todo um elenco de fatos extraordinários, os quais, entretanto, nem de longe parece terem tido o condão de ressuscitar Deus.

Evidentemente, existem os religiosos: o Papa ainda reza a Missa do Galo, os crentes em suas denominação cada vez mais numerosas (a contar pelo número de pastores "empreendedoristas"), continuam a erguer seus braços na saudação a Cristo Jesus e em seus "aleluias". Algumas igrejas católicas esplendem em cores e luzes. Além do mais, há o islamismo. Dizer que Maomé já não tem Deus para ser seu último profeta, parece desconsiderar uma religião que cresceu desmesuradamente nos últimos anos, a ponto de os islâmicos serem, no mundo atual, em números, uma comunidade muito maior que a cristã. De fato, há aspectos de guerra religiosa na resposta que muitos muçulmanos dão às bombas dos EUA e da Otan, que negam, em princípio, a morte de Deus. No entanto, pode-se objetar que, ainda assim, soa inclusive para muitos seguidores do Profeta, quase uma regressão conceber a organização das sociedades em Estados Religiosos. No próprio Irã, aliás, há quem dê como como em dias contados, a manutenção da predominância dos clérigos na condução do Estado. Lá, também Alá estaria morto.

A questão, contudo, não parece simples; e não é. Há anos, um religioso escreveu um livro sobre a arte sacra do nosso tempo. Defendia que ela existiria, a despeito da irreligiosidade desenfreada que paradoxalmente se seguiu à Segunda Guerra. Referia-se ao catolicismo e nomeava alguns artistas contemporâneos. Olivier Messiaen que morreu não faz muito, foi, realmente, um compositor que sempre se postou como católico. Escreveu obras textualmente, "para Jesus" e guardou-se de que sua fé era inquebrantável, o que não deixou de ser reafirmado até sua morte. Georges Rouault, pintor, um pouco mais velho que Messiaen, francês como ele, fez uma obra quase que inteiramente religiosa. Françoise Gilot, ex-mulher de Picasso, autora de um livro sobre o pintor, refere-se a Rouault como um artista, eminentemente, religioso. O próprio escritor inglês Graham Greene, morto há uns vintes anos, expôs o problema religioso no âmbito das questões existenciais prioritárias do nosso tempo. Mas, pelo fato de ter colocado a questão, justamente como "um problema", não parece ter esmorecido a questão concreta de que, com ou sem "o problema", Deus estaria, de fato, morto.

Pode-se, certamente, ler de muitas maneiras a afirmação ("aforismo") de Nietzsche. A um homem convicto de sua fé - e há um sem número deles, inclusive entre grandes intelectuais e cientistas - a consideração seria ociosa, até contraditória. Teria de se a avaliar a questão com as devidas reservas: José Saramago, um decidido agnóstico, não imputou a Deus o "grande mal do mundo"? Como considerá-lo morto, se a cada homem-bomba no Iraque ou no Afeganistão, reacende-se a questão do martírio, que só se concebe na crença de uma fé inquebrantável? Realmente, é assim. Mas se torna cada vez mais difícil associar a Natal ao nascimento de Cristo. Ou melhor: existe muito pouco, na "maior festa da Cristandade" que conduza à conclusão de o Natal ser realmente uma festa cristã.

Claro, alguém dirá que é próprio do capitalismo não estreitar comemorações na religião. Complicado, realmente, vender certos produtos com as menções a Deus. Geladeiras e máquinas de lavar roupa, com as bênçãos do Manjedoura, são difíceis de engolir. Os religiosos que o digam.

Há as medalhinhas católicas e os dízimos protestantes, sem dúvida: todos são produtos vendidos ou comprados "em nome de Deus". Os pagadores de promessa, que se reúnem em Aparecida, aumentam sempre, talvez não na mesma proporção de tempos atrás, mas são numeroso; só que, em todas as manifestações, o que nos identifica já não é a totalidade do ser religioso socialmente, senão a especifidade de o sermos, no âmbito de nossas respectivas igrejas e templos.

Parece ser, enfim, inelutável entre os homens, a existência de um sentimento religioso difuso. Mas já Deus é um traço subjetivo, que não se expõe na última análise das músicas, cantadas nos templos, que só têm de verdadeiramente religioso a invocação direta a Deus. Canta-se Deus em forma de rock, de música de alto consumo, mas justamente por ser também Deus um objeto de consumo. Ou seja, parece que Deus prescinde de uma música especial, de comportamentos que distingam os religiosos dos consumidores. Somos crentes para invocarmos Deus, mas não para nos alijarmos dos outros como uma característica especial.

Durante as perseguições religiosas na Roma antiga, a marca do cristão era uma espécie de divisor de águas: não havia a "mercadoria Deus". Deve ser por Papai Noel mostrar-se tão importante, que se prescindem as ginásticas para não ofendermos ninguém, ao não invocarmos Deus justamente naquela que seria a marca da "maior festa da Cristandade"?
A pensar, certamente.

*Enio Squeff é artista plástico e jornalista.

Fonte: Carta Maior

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

O SENTIDO DAS INTERVENÇÕES URBANAS: CALÇADÃO DE JACOBINA.

  O SENTIDO DAS INTERVENÇÕES URBANAS
Por: Luiz Brasileiro
A arquitetura de uma cidade reflete o nível cultural de seus habitantes e governantes. Casas geminadas, sem nenhum gosto, ruas estreitas e não arborizadas, passeios mal cuidados e estreitos são resultado do descaso e da ignorância dos habitantes e dos governantes para com os espaços públicos, tão importantes quanto outros aspectos da cidade.

As intervenções urbanas devem ser feitas sempre em função do bem estar dos habitantes da cidade, não para empobrecer-lhes a vida retirando beleza, conforto e qualidade.

Desta maneira não é tolerável e racionalmente admissível que as intervenções do poder público causem desconforto e angústia aos habitantes. As mudanças para pior não devem ser feitas, se efetuadas não devem ser mantidas.

O despreparo dos governantes, ignorância e falta de gosto às vezes são os motivos causadores de agressão estética a uma cidade quando não revelam mal disfarçado ódio e desprezo por uma população.

Mudança para pior

A intervenção da Prefeitura do Município de Jacobina no Calçadão substituindo o calçamento em pedras portuguesas por estes tampos de cimento bruto tem conseqüências práticas, constatado que refletem mais calor abrasando ainda mais o clima das cidades que tende para um clima de deserto devido à impermeabilização do solo e a consequente redução de áreas verdes na cidade e em seu entorno.

Precisávamos de mais plantas ornamentais no Calçadão de Jacobina, bancos de madeira (melhores do que já existiam), regulação das placas nas fachadas das lojas para reduzir a poluição visual para que este espaço público, de comércio e convivência fosse um lugar agradável e de bom gosto.

Outra coisa necessária para aperfeiçoar o mais importante espaço público da cidade era a substituição da fiação. Já que se fez uma intervenção desta natureza que se fizesse também a substituição da fiação da rede elétrica e telefônica exposta e aérea por subterrânea, menos perigosa e que não enfeia as ruas com tantos fios à mostra.

O uso da madeira nos bancos, das pedra portuguesa e das plantas ornamentais descansam a vista, tornam a temperatura do ar mais amena além de agregar valor estético ao ambiente; refletem o bom gosto, cultura e cuidado dos habitantes e dos governantes por suas casas e cidades.

Ninguém pode obrigar outrem a ser educado. Há indiscutivelmente quem goste de sujeira, feiúra, furto, humilhações, puxa-saquismo, analfabetismo e outras coisas horríveis. Mas a comparação invade os olhos ao contemplarmos um esgoto que já foi um rio, o Calçadão anterior e este monumento a feiúra e à pobreza estética.

O Calçadão tal como foi feito e anteriormente se encontrava não era um primor e muito poderia ser melhorado, mas a intervenção foi um regresso, uma agressão ao que já tinha sido conquistado em beleza e cuidado com a cidade. Se o calçamento com pedras portuguesas dificultava o deslocamento de deficientes físicos usuários de cadeiras e de mulheres com saltos altos o melhor seria substituir as pedras portuguesas por granito e não por estes tijolos de cimento inferiores até mesmo às pedras portuguesas.

Faremos um dia, espero que seja o mais breve possível, um Calçadão melhor e mais bonito que o anterior. Serve de refrigério saber que tudo passa, e este atentado ao bem estar dos cidadãos desta cidade passará, como várias pestes passaram na Idade Média e passaram as sete pragas no Egito.

Perene é o povo, perene é a liberdade.